quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Design: tanto bate até que fura!


No Natal ganhei um belíssimo relógio Swatch de presente. Já tive diversos, sempre do mesmo modelo básico, em acabamentos e cores diferentes.  É uma peça clássica no pulso de um designer. Pois não é que ele foi “aperfeiçoado” e agora vem com especial coletor de suor na pulseira!
Detalhe da pulseira
Depois de um dia de uso, em nosso verão tropical, a pulseira passa a ter um cheiro insuportável ocasionado pelo suor acumulado juntando poeira e outras bactérias. Os designers acrescentaram umas nervuras na parte interna da pulseira plástica, sempre lisa nos modelos anteriores, que faz a poeira e suor se acumular nas mesmas de forma inexplicável. Agora temos que lavar o relógio dia sim e outro também para poder usá-lo de forma adequada, sem vexames ou repulsas.

Olha o calor saindo!
Sempre me perguntei por que nós designers temos que “contribuir” de forma errada para o aperfeiçoamento dos produtos que desenhamos ou redesenhamos.  Como exemplo, temos o novo porta-filtros de papel de café da Melitta. Ele sempre teve um design elegante e adequado, feito por designers brasileiros, que foram premiados há alguns anos atrás no Premio Design do MCB.  Esta nova versão tem uma “janela” na parte inferior que a publicidade declara ser para se “ver o café passando”! Ora sabemos que café deve manter-se o mais aquecido possível ao entrar na garrafa térmica. Com esta janela agora temos como ver, mas também como esfriar o café durante o processo de armazená-lo!!!  Na publicidade vê-se o calor indo, indo, indo!

Gol Geração VI
Mesmo em grandes montadoras há situações semelhantes. Foi lançado no ano passado um novo modelo, geração VI, do automóvel Gol da Volkswagen,  grande sucesso no mercado brasileiro.  Neste modelo redesenhado temos agora menor espaço no banco traseiro, um porta malas menor e um vidro traseiro também com menor visibilidade devido às colunas e sua inclinação. Sabemos que esses eram pontos fracos do Gol em todos modelos anteriores, mas precisava piorar??? 
Gol Geração V


Quando se observa outro modelo da empresa o Fox, fica evidente que eles sabem como resolver estes problemas. Então por que cargas d’água os designers, e também os executivos da empresa, não adotam o principio de que aquelas soluções de espaço e dimensionamento são universais?


Outro exemplo: a nova geração de caixas automáticos do Banco Itaú, um banco que prima por utilizar o design como característica de sua atuação no mercado.  São os modelos que estão sendo instalados nas antigas agencias do Unibanco, ao serem reformadas. A começar pela cor, que antes era uma combinação harmoniosa de cinzas e azuis, ela foi substituída por um tom de prata fosco e texturizado. Todos os terminais ficam engordurados com o uso e sujos quase que instantaneamente, pedindo uma manutenção diária impossível de ser feita. Além disso mudaram o ângulo das telas, agora maiores, que causam uma paralaxe, dificultando a leitura e a digitação por parte dos clientes. O ângulo anterior era dirigido aos olhos do usuário, os atuais são dirigidos ao peito do usuário, o que dificulta o “touch screen”. Os novos modelos não possuem mais uma superfície para apoio de documentos, cartões de credito ou recibos emitidos pela maquina. Além disso tiveram os locais de colocação de cartões e retirada de dinheiro totalmente alterados, em relação aos anteriores, o que sempre confunde os clientes, como pode ser observado, em cinco minutos de observação in loco!

Ângulos de tela diferentes?
Para finalizar e como exemplo mor desta tendência, temos a linha de veículos Adventure fabricados pela Fiat no Brasil. Essa linha que se caracteriza por ter acabamentos mais rústicos nas extremidades da chapa, protegidos por elementos plásticos, vem se alterando de geração em geração. Como a base da carroceria é a mesma, o que se altera são os elementos plásticos na frente, traseira  e nas laterais junto aos para lamas. O aumento progressivo do volume destas peças passou a ser disforme, parece que vai tomar conta dele e pedem adaptações, como os recortes junto à tampa de combustível que beiram o grotesco! Em qualquer análise formal mais cuidadosa destes detalhe, eles seriam classificados como verdadeiros defeitos do design!!! Fica então a pergunta: será que os competentes designers da Fiat em Betim não notaram isso? Ou será que fizeram de propósito para chocar o observador, o usuário ou os concorrentes. Confesso que não entendo!


Bonito ou exagerado nos defeitos???
O design e seus praticantes, têm uma faceta um pouco questionável, onde as modificações tem que ser introduzidas por razões de “mercado” ou de “tendências”.  A necessidade de redesenho com o objetivo de dar sobrevida a modelos ou produtos, nos faz sacrificar o que se objetiva, que é o valor agregado intangível do design na nossa cultura material. Design “demais” pode na verdade, e em nome da “personalidade”, chegar ao ponto de retirar a qualidade e pecar pelo excesso, alterando forma e função, negando assim sua própria essência.
Em nossa sociedade industrial globalizada o design parece estar ressuscitando o velho Styling e sua rápida obsolescência, que aparentemente abandonamos nos anos 60 do século passado. Será essa a pedra de toque deste novo milênio?
Espero sinceramente que não!