quarta-feira, 24 de abril de 2013

Um país sem Projeto???


Fatos recentes divulgados pela imprensa demonstram que caminhamos celeremente para ser um país sem projeto. Casas populares que se desintegram antes dos seus moradores as ocuparem, de forma injustificada; estádios que são interditados por falhas de projeto e de execução; carros de metrô que são encomendados com especificações inadequadas ás estações que devem servir; prédios para desabrigados que desmoronam fruto de chuvas fortes; sistemas de transporte que tem que ser refeitos logo depois de inaugurados; instalações esportivas que são inadequadas a padrões internacionais ou tem seu custo multiplicado durante a construção, além de uma perplexidade diante dos caminhos do planejamento da economia e da vocação da nação.

Somos o país do “jeitinho”, do “improviso”, da “gambiarra”, da informalidade, da criatividade! Depois da fase de desenvolvimento, iniciada com a siderurgia nos anos 50, da indústria automobilística, nos anos 60, do milagre econômico dos anos 70/80, da abertura nos anos 90, da globalização do inicio deste século já era tempo, de termos uma nova visão de como planejar e projetar nosso futuro. Já deveríamos ter modificado nossos hábitos, no sentido de tomarmos na mão nosso desenvolvimento de forma independente. Sempre fomos o país do futuro, como definiu Stefan Zweig nos anos 40, mas parece que este futuro chegou e não nos demos conta ainda. Nestes períodos mais recentes tivemos que acelerar certos passos e tomar atalhos para fazermos frente ao cenário mundial, especialmente nesta crise mundial que atravessamos, onde a tecnologia se tornou a referencia do momento.

Ultimamente temos ouvido a menção quase que constante ao termo inovação. Temos que inovar para podermos nos desenvolver, para sobreviver. Ora o que entendemos por inovação??? Há uma crença de que está aliada a tecnologia, ou a pesquisa ou ao conhecimento. Não é, porém compreendida como ligada a projeto! Temos muito pouca pratica de projeto e por isso não somos inovadores, essa é que é a realidade. 

Como ainda somos um país pobre, com poucos recursos financeiros, este passou a ser a nossa referencia de eficiência, inclusive no slogan oficial do governo. Tudo deve custar barato, tudo deve ser definido pelo preço mínimo. A Lei das Licitações, que rege as compras públicas, por exemplo, é clara neste ponto, preço mínimo acima de tudo. Só que preço mínimo significa custo mínimo, que redunda em economia de recursos para atingir sua meta, que é vencer a concorrência!

Nas compras públicas já se aboliu o projeto completo como exigência para a licitação da obra. Devido aos prazos curtos das concorrências nos utilizamos de anteprojetos para cálculos e licitações, admitindo-se que o projeto executivo seja feito pelo construtor, ou vencedor da concorrência, concomitante com a obra ou o serviço a ser executado. Acreditam que sem projeto se ganha tempo! Resultado: adiamentos, renegociações, revisões de orçamento, suspeições de superfaturamento e em muitos casos paralisações ou mesmo abandono de obras antes de sua conclusão. Os tribunais de contas não tem como comparar as especificações propostas para as obras com sua realização devido a essa promiscuidade sem solução. Podemos então imaginar o que vai acontecer com todas as obras atrasadas para os grandes eventos que se avizinham!

No setor privado se vê é um descompasso com a época em que vivemos. A rapidez necessária para responder às demandas do mercado não tem a eficiência desejada. É comum empresários nacionais serem alijados do mercado por produtos mais avançados ou mais baratos que são lançados pelos concorrentes estrangeiros. O ritmo e ciclo de vida de um produto no mercado hoje em dia é vertiginoso. Nossos industriais, pelo fato de não terem o habito de projetar seu próprio futuro são pegos de calças curtas! Para sobreviver resolvem copiar os lideres de mercado ou mesmo se transformarem em distribuidores de produtos asiáticos, deixando de lado sua produção, por ser mais custosa e sem eficiência ou rentabilidade. Um exemplo: na indústria automobilística, considerada a mais avançada do país e toda ela de capital multinacional, é comum serem produzidos modelos defasados da realidade mundial, já que não há projeto que faça frente vindo dos concorrentes. E a nossa competitividade como fica??? Temos perdido nossa capacidade em diversos ramos e lentamente retornamos a ser dependentes em nosso desenvolvimento.

Nestes novos tempos temos o fator ambiental a ser considerado, além da sustentabilidade.
O fazer mais com menos, com o mais adequado, com o menos danoso, com o mais natural. A nossa sociedade exige a adoção destes princípios, pois ela percebe as conseqüências na própria pele. A nossa elite empresarial, no entanto só o fará se forçada, já que considera que ainda há muito que poluir ou degradar, antes de tomar medidas conservacionistas em seu projeto de desenvolvimento. Se é que essa elite tem projeto de desenvolvimento!?!?

E o design como fica neste contexto? Neste cenário de descaso, tanto por parte das autoridades como de nossa elite industrial quanto ao projeto, aonde vamos empurrando com a barriga nosso desenvolvimento, é cada vez menor a chance de termos bons resultados em curto prazo. Antevemos um cenário cada vez mais defasado e prejudicial ao nosso futuro. Sem um programa de indução, de incentivo, de valorização do design e do projeto pouco poderá ser acrescentado de criativo a essa realidade, de forma mais ampla e eficaz. Não nos adianta ter uma profissão que lida eminentemente com inovação se não houver um terreno fértil para que ela seja aplicada. O valor agregado que o design pode adicionar a nossa economia, por um custo irrisório, deixará de existir em curto espaço de tempo, devido a ignorância sobre significado do projeto de design, bem como sua importância em nossa época.

Caso venhamos a perder a nossa capacidade de projeto, com a perda do “know how”, a sua retomada e restauração será dolorosa, custosa e demorada. Não se prepara mão de obra de projeto em curto espaço de tempo e essa mão de obra se perde sem a prática, bem como sem a experiência. Se perdermos nossa capacidade de projeto sofreremos um revés que poderá se tornar um assunto de verdadeira “Segurança Nacional”, termo comum na época da Ditadura.

Nossa experiência acumulada, que já é pouca, ficará perdida e será nenhuma em breve, se não adotarmos como principio que temos que formular e implantar um projeto para este país onde o design será parte fundamental.

É isso o que projetamos!!!!

Texto não publicado

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Degustação e Design


Imaginem se ao frequentar o Dentista pela primeira vez ocorresse o seguinte diálogo por parte do Cliente: – “Gostei de seu preço e de suas referencias, mas estou com dificuldade em aceitar suas propostas. Por isso vou lhe pedir que faça a pontinha do meu molar esquerdo se eu gostar pago o valor cobrado e continuo com o tratamento.”
Ou se ao consultar um Advogado o Cliente sugerisse: “Me faça a petição de divórcio. Se eu achar que está em acordo com minhas expectativas lhe pago a petição e continuamos com o processo.”
É possível isso acontecer com um dentista?? Ou a um advogado?? Então porque isso acontece com os designers??? E de forma muito freqüente, especialmente com clientes que nunca se utilizaram dos serviços de um designer. É ver para crer!!!

Nossa profissão, em relação aos clientes, tem algumas características muito peculiares e que ainda me causam estranheza, mesmo depois de tantos anos de prática.  O Designer tem uma atividade eminentemente visual. Todo profissional possui um portfólio de trabalhos que ele exibe de diversas formas. O mercado reconhece os projetos ou produtos dos designers mais conhecidos. Isso não acontece com as profissões dos dentistas ou dos advogados. Mostramos nossa produção em sites, revistas, reportagens, exposições e em outras mídias. Somos conhecidos pelo que produzimos.

Ainda assim há um medo do risco de contratar um designer, que mesmo com todas estas evidências me parece nada justificável. Contratamos dentistas ou advogados com bem menos referências e damos a eles a confiança de nossas “bocas” ou nossas “causas" correndo assim maiores riscos,  do que em um projeto de design.

A falta da cultura do Design em nossa realidade, mesmo depois de 50 anos de implantação do Design em nosso pais, já me fez ouvir absurdos como: “Preciso de um estagiário com grande experiência em projetos de embalagem de papelão”. Ora onde encontraremos um “estagiário” com grande experiência em qualquer coisa???

A “degustação” de um projeto de design é quase tão danosa quanto a concorrência  especulativa, muito solicitada por empresários pouco afeitos ao Design. Vemos tanta concorrência ou licitação sendo feita sem projeto, tanta improvisação na solução de problemas públicos, mesmo os mais comuns e corriqueiros, que me passa pela cabeça que o nosso problema é justamente aí: não sabemos o que é PROJETO!
Nosso passado colonial talvez seja responsável por esta tendência tão comum, em nossa realidade, de que é na Corte que se pensa e projeta.

A nós cabe apenas executar ou no máximo copiar!!!

Texto não publicado.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                  

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Pontes sobre a Vida

Foto: Cezar Duarte

Há um tempo tive a oportunidade de estar em Manaus, na Amazônia.  No trajeto de taxi me surpreendi com o numero de pontes e viadutos em construção pela cidade, em cruzamentos importantes. O mesmo aconteceu em Belo Horizonte, onde a construção de novas vias rápidas é acelerada pelo fato da Copa ter uma de suas sedes na capital mineira. O privilégio dado aos automóveis em nossas cidades farão explodir a necessidade de viadutos e pontes  em nossas estruturas urbanas.

No Rio de Janeiro temos a discussão em prol da demolição, por sua alegada feiúra, da Avenida Perimetral, um grande viaduto e via expressa que circunda o Centro do Rio, por uma Prefeitura que permitiu a construção de uma combinação de ponte/passarela/estação de Metrô, das mais horríveis, em frente a sua sede na Cidade Nova.

Pontes e viadutos são itens polêmicos.  Seus autores, arquitetos e engenheiros, comumente as chamam de "obras de arte". Em alguns casos o são, pela sua sofisticação de concepção e construção. Entretanto, na sua maioria, nestes tempos modernos, são na realidade verdadeiros arremedos de obras funcionais, que somente tem aspecto aceitável quando inauguradas.  Na verdade, das obras públicas existentes as pontes e viadutos são as mais relegadas a um segundo plano. Sem manutenção adequada passam a atrair pichações, moradas de mendigos, fogueiras e depósitos de lixo ou mesmo cracolândias, como em episódios mais recentes vistos na mídia. No Rio a administração atual encheu essas áreas de pedras pontiagudas com o intuito de dificultar os desabrigados que ali procuram refúgio. A expressão “dormindo em baixo da ponte” é considerada popularmente a forma mais baixa da condição humana.

Dificilmente uma ponte ou viaduto são pintados, limpos, ou recuperados em sua parte inferior. Dificilmente é dada outra função para a parte coberta pela ponte ou viaduto, a fim de espantar os habitantes de rua que a freqüentam durante a noite ou em dias de chuva. Poucas têm iluminação adequada, que permita aos moradores ou freqüentadores da região usufruir de uma área coberta e protegida das intempéries. Há um caso de uma escola de samba no Rio de Janeiro que se apropriou de uma área sob um viaduto e utiliza para ensaios que são muito concorridos, mas é um caso único. Quando se projetam sobre rios as pontes se transformam em verdadeiras arapucas de lixo, galhos, sofás e tudo o mais que jogamos em seus leitos, de forma irresponsável. Durante a administração anterior da Prefeitura do Rio houve uma tentativa de abrigar cooperativas de catadores sob os viadutos da cidade, que foi abortada sem que soubéssemos os motivos.

Já é tempo de nossos engenheiros, arquitetos, paisagistas e construtores comecem a pensar e resolver o que fazer “embaixo da ponte”. Como mantê-las, utiliza-las, conserva-las, habita-las, valoriza-las ou ocupa-las, no mínimo embeleza-las. Garanto que se uma ponte, ou viaduto, fosse projetado e construído, aqui no Brasil, com a autoria do arquiteto espanhol Santiago Calatrava, seria considerada obra de arte, ícone da região, atrativo de turistas e teria equipe permanente de manutenção. Não estamos advogando que isso aconteça com todas as pontes e viadutos, mas sim que os que decidem sobre sua construção pensem o que fazer para ir além da utilidade funcional das pontes e viadutos, determinando o que acontecerá com sua parte inferior de forma permanente. Afinal não podemos desperdiçar dinheiro público na construção de algo cujo destino é ser implodido em administrações futuras, em nome da estética ou da necessidade de uma nova obra que a substitua, que pode ser um “mergulhão”, destinado a ser mais horroroso e perigoso ainda.

O profeta Gentileza, figura folclórica carioca, sabia o que estava fazendo quando resolveu, nos anos 80 decorar com seus escritos os mais de 50 pilares da Perimetral,  viaduto extenso nos arredores da Estação Rodoviária do Rio de Janeiro.

 As transformou em obras de arte, no sentido literal!
Vamos ver até quando elas resistem!!!

Texto não publicado.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Goebel Weyne na visão de um amigo.

Foto: Noni Geiger 2001

Na cremação do Goebel, seu amigo, o arquiteto Jacó, colocou a mão no meu ombro e comentou inconsolável: “não vai haver outro igual”; constatação parecida à do Rodolfo, ao escrever que, apesar de toda pessoa ser insubstituível, Goebel é mais do que a maioria. E assim é pela combinação de características que conformavam uma personalidade absolutamente singular. Era generoso, desde a gorjeta extra para o garçom, até a disponibilidade para seus interlocutores. Era orgulhoso da amizade com o “Tom” (Jobim), o “Oscar” (Niemeyer), o “Rubem” (Braga) e muitos outros. Era também impulsivo, capaz de reações muitas vezes desproporcionais, mas nunca de todo infundadas. Era valentão. Cansou de xingar a mãe dos motoqueiros mais afoitos (e de peitá-los quando voltavam tirando satisfações). Alguns o achavam parecido com Walther Matthau. Talvez mais do que semelhança física, era o jeito gaiato de Goebel que sustentava essa comparação. Ele exercia a gaiatice com maestria. Se estivesse caminhando e conversando com alguém, e um grupo falastrão viesse logo atrás, era habitual relaxar o passo, deixando o grupo passar; praguejava então alguma coisa, e só depois retomava a conversa. Às vezes fazia isso, apontando para o céu, para “justificar” a parada repentina, fazendo com que os passantes olhassem todos para cima (desconfio que fazia essas coisas mesmo andando sozinho.). Desde quando o conheci, era rabugento e comicamente azarado (ou, o mais provável, fazia do azar algo cômico). Seu humor ia da fina ironia às histórias mais absurdamente escatológicas. Manifestava-se em causos, piadas, bordões (muitos!), caricaturas e apelidos, os mais hilários. Esses últimos, dava aos próximos, e não tão próximos, (muita gente até hoje não deve saber que teve um). 

Se em algumas situações me pareceu autoritário, intransigente, repetitivo, pernóstico, e até ingênuo; no mais das vezes, eu o considerava sábio, condição que hoje teria dificuldade em enxergar em outra pessoa. Não era só pelo conhecimento enciclopédico, pela memória privilegiada ou pela rapidez nas piadas, nas ideias e nas soluções; mas também pela presença de espírito gigantesca, pela capacidade de apreensão fora do comum e por um sagaz entendimento da natureza humana. Além disso, Goebel também era íntegro, reto e direto, como seus trabalhos. Normalmente, essas características se revelam em pessoas diferentes e em situações diferentes. No Goebel, se manifestavam em abundância e com autenticidade desde a primeira conversa mais demorada. 

Para os alunos que o aceitaram, foi um dedicado mestre. Certa vez ouvi (não sei de quem) que aprender com Goebel é como ter aula de guitarra com Jimi Hendrix. Também não sei o contexto exato desta afirmação, mas assim como seria difícil atinar Hendrix lecionando em uma situação formal de sala de aula, assim era com Goebel. Foi autodidata e se orgulhava de, por isso, ter escolhido seus próprios professores. Talvez por esta razão, seu didatismo fosse de natureza diferente da habitual. Não era um transmissor de matérias prontas ou um ‘ajeitador’ de layouts dos alunos, na base do “mais para cá, mais para lá”, como dizia. Com ele, não funcionava pedir comentários sobre um trabalho pronto ou resposta para uma pergunta pontual. Nada era pontual. Não estava interessado na pragmática imediatista e sim nas relações entre as coisas. Assim, o que funcionava, era ouvi-lo sem pressa. E para quem tivesse essa disponibilidade, além da aula de “guitarra”, aprendia sobre filmes, livros, músicas, por meio de uma sempre atordoante quantidade de referências. Aos seus alunos, interessava transmitir não a objetividade da resposta rápida (aprendida mais cedo ou mais tarde), mas aquela objetividade apoiada nas relações, nos paralelismos e nas conexões entre conceitos e coisas, base de qualquer conhecimento em design. Considerava que, no entendimento dessas relações, está a justificativa para um design menos camuflado na grandiloquência de estilos pessoais ou modismos e mais sustentado pelo conceito forte e pela inovação, ainda que sutil. Nesse sentido, suas “aulas” eram uma demonstração de como as coisas, sendo mais simples, seriam mais elegantes. Era-lhe importante atravessar a camada barulhenta das ideias prontas e clichês para revelar as estruturas subjacentes. Nesta escala elementar, na escala das coisas simples, estaria a verdadeira novidade do design. Não se tratava de mero conceito teórico, e sim de um princípio exercido com maestria na sua própria prática, ou melhor, proveniente dela. 

Com todas as contradições que isso acarreta, foi um designer moderno por excelência. Simples, objetivo, metódico, preciso, alemão, suíço, ulmiano, mas brasileiro e cearense. Aqueles que enxergam no design dito racional, uma relação necessária com o clima frio e uma suposta sisudez e introspecção europeias, reivindicando um contraponto “quente” para um design genuinamente brasileiro, o trabalho e a pessoa de Goebel podem confundir. Quem o conheceu sabe que estava longe de qualquer sisudez ou introspecção. Nascido no nordeste, era também grande conhecedor de sua rica cultura; mesmo assim, não baseou seu trabalho nas raízes nordestinas. Escolheu suas referências por convicções projetuais e não pela sua personalidade ou por ideais nacionalistas. Aprovado em Ulm, não conseguiu bolsa para a família e não cursou a escola alemã, mas, ainda assim, tornou-se mais ulmiano que seus egressos. Acreditava que, se houvesse algo como design nacional, não seria por uma derivação direta de simbolismos e trejeitos estereotipados e sim, mais provavelmente, pelo modo particular como alguns grupos interpretam certos princípios universais de projeto, daí sua admiração e identificação com a HfG Ulm. Além disso, para quem vê o design racional como mera replicação de modelos pré-existentes, novamente a produção de Goebel é um contraponto. Todo bom design se revela pela capacidade de invenção, e nisso Goebel foi excepcional. Não lhe interessava a auto-expressão, e sim revelar um aspecto crucial que comunicasse o espírito do problema com que estava lidando (um cartaz, uma revista, uma exposição...). Isso acontecia não só pelo reconhecido rigor no uso dos recursos formais, mas também pela cuidadosa escolha dos signos (como gostava de chamar os elementos com que trabalhava) e pela engenhosidade e simplicidade com que programava os critérios para a sua articulação. Resultando em algo visivelmente derivado de uma programação, mas de grande interesse estético, reservado sobretudo ao observador atento, a quem surpreendia pelas pequenas, mas eloquentes, partículas de invenção. Nisto, nunca foi modesto, “Sou um homem de ideias” repetia com frequência. De fato, ideias e ideais. Comunista, moderno, modernista. Acreditava no design, e na ideia da escola que ajudou a criar. Talvez por isso tenha sido seu crítico ferrenho. Suas convicções de certo o prejudicaram em várias ocasiões, mas não era do seu feitio fazer concessões. Foi sobretudo um homem corajoso. Talvez sua maior grandeza foi ter tido coragem para viver a vida de acordo com suas convicções. 

Apesar de cioso da correção nas informações sobre sua biografia (espumava com as frequentes referencias erradas) não se interessou em preservar seu passado, de modo que muitos dos trabalhos que o colocariam no lugar que lhe corresponde no Design, desapareceram em parte ou no todo. O que seria visto como displicência, na verdade, pode revelar uma profunda identificação com a ideia de projeto como antecipação do futuro (“pro.jeto”), distante assim de qualquer ideia de retorno ao passado. Infelizmente, o futuro lhe surpreendeu. A vitalidade de Goebel aos 79 anos nos fazia crer, que o inevitável destino de todo homem, mais do que “poderia”, “deveria” ter esperado mais um pouco. É duro quando uma personalidade assim, simplesmente, deixa de existir.

Texto de Luiz Arbex, ex-aluno e amigo, publicado no Facedbook em 20/12/2012 e no SINAL 466, por ocasião do falecimento de Goebel Weyne.