segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Um brinde a Sergio Rodrigues!


"Ainda não criei nada hoje" foi a resposta que Sergio Rodrigues deu a uma jornalista que insistia em saber dele "quais eram as tendências atuais em Design de mobiliário". Essa resposta irônica era rara por parte de uma pessoa tão afável e receptiva a qualquer solicitação. Na ocasião ele me argumentou que estava farto desta mania de "tendências", como se fossemos sempre seguidores de alguma coisa. Sergio exercitava o poder da criação e da invenção, sem restrições, sempre!

Conhecia a obra de Sergio mesmo antes de minha formação. Via seus produtos serem publicados e conhecia sua loja na Rua Jangadeiros, onde a OCA promovia lançamentos e exposições. Anos após minha graduação fui convidado pelos novos proprietários da OCA a trabalhar na empresa e criar novos produtos, já que Sergio não cooperava mais com eles. A responsabilidade era grande e um pouco assustadora. Ainda assim mergulhei em conhecer e analisar toda a produção deles e estabeleci um linha politica que tentei seguir para que a OCA não perdesse sua identidade. Revalorizamos os produtos do Sergio batizando-os de OCA Clássica, convenci os executivos da empresa a recontratar o Sergio, para criação de novos produtos. Depois de um período de certa desconfiança, onde um "menino", como ele me sempre chamava, estaria mexendo na "sua" OCA, finalmente o conheci pessoalmente e acabamos ficando amigos. O design nos uniu e colaboramos de forma integral em diversos produtos para a empresa.

Tive que ajustar alguns detalhes na sua famosa Kilin, para torna-la um produto de exportação, que incluiu o sucesso de exporta-la para a IKEA na Suécia. Fui apresentar as minha sugestões ao Sergio , morrendo de medo de sua reação. Depois de muito olhar aprovou todas elas, elogiando inclusive a embalagem e instrução de montagem que tinha desenvolvido. Ele me fez uma especial  referencia no seu livro, o que se tornou uma verdadeira honra para mim.

Em outra ocasião tivemos a oportunidade de compartilhar nossa convivência durante um curso para empresários moveleiros em São Bento do Sul, eu e Sergio, junto com Michel Arnoult e José Chaves. Foram alguns dias de intensa tentativa de fazer descer o Design pela goela a baixo desse pessoal. Saímos todos de lá frustrados, e achando que não havia esperança para o setor, em nosso pais.  Porém nos divertimos muito com as histórias inventadas de Sergio que tinha enormes afinidades com Michel, onde ambos se provocavam mutuamente, sempre com o melhor humor possível. Nesta ocasião descobrimos um outro ponto de identificação: saborear sorvete de creme com café expresso por cima, para espanto dos garçons dos restaurantes catarinenses.

A criatividade de Sergio e sua bondade sempre se fizeram presentes em todas suas iniciativas. A mania de dar nomes a seus produtos, me surpreendeu quando a pouco tempo identifiquei um sofá com meu nome, em seu livro, desenhado muito antes de nos conhecermos, fato do qual não tinha conhecimento. Sergio é sempre surpreendente!

Sentiremos falta de sua presença simpática em todos os eventos sobre Design que ele prestigiava, mesmo que insistisse que ele não era designer. Sua obra estará sempre presente em nosso futuro, por meio de sua produção, de seu Instituto, de suas publicações. Mas vai ser difícil não tê-lo, ao alcance de um convite, de um celular, de uma visita em seu estúdio, para um momento de convívio, onde sempre tinha um sorriso, presença agradável e carinhosa. 

Foi um verdadeiro privilégio conhecer e conviver com Sergio Rodrigues, especialmente neste dia em que faria faz 87 anos! 
O Brasil deve muito a ele!

Um brinde a isso!

Texto publicado no Informativo "Sinal 494"

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Uma pequena história de uma Guerra de 50 anos


Finalmente foi travada a batalha final e a ESDI venceu!  Conseguimos, em definitivo a posse de nosso terreno ao final de 2013. Para quem não sabe foi uma batalha derradeira de uma guerra de 50 anos, isto é desde que a ESDI,  a Escola Superior de Desenho Industrial existe!

Ao ser criada, a ESDI passou a ocupar, de forma provisória, um conjunto de terrenos onde está até hoje. Os terrenos em questão eram próprios da antiga Prefeitura do Distrito Federal repassados ao Estado da Guanabara como resultado da Lei Santiago Dantas de 18/04/1960.
Predio da ESDI -1963
A ESDI, fundada em 1962, se instalou neste local em 1963 na qualidade de primeira escola de design do Brasil, como uma unidade isolada da então Secretaria de Educação do Estado da Guanabara. Após a fusão a ESDI foi incorporada no ano de 1974 à UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro da qual é uma de suas principais unidades. Apesar da prerrogativa que o estado possuía, por força da lei citada acima, a regularização da situação destes terrenos nunca foi efetivada. 
Mesmo com a insistência de sua diretora da época, Dra. Carmen Portinho a Secretaria de Educação e mais tarde a própria UERJ, pouco fizeram para a regularização da posse destes terrenos. E a primeira batalha ainda estava por vir: os terrenos foram cedidos a uma outra instituição, a Academia Brasileira de Ciências.

O processo de cessão se originou de uma informação equivocada dada ao então Presidente João Figueiredo, ao apagar das luzes de seu mandato, pelo Governador Leonel Brizola. A informação dizia erroneamente que nos terrenos pretendidos por aquela Instituição, situavam-se “duas repartições públicas” e, com base neste equívoco, uma vez que neste espaço situava-se a ESDI com uma área construída de 2.500 m2, o Presidente Figueiredo formalizou em 1984 a cessão sob regime de aforamento, sem que na ESDI e a UERJ, tivessem qualquer conhecimento prévio desta intenção.

O projeto da Academia era construir dois prédios de doze e quatorze andares, o que não foi possível pelo fato dos dois terrenos, remembrados em um só, fazerem divisa com os prédios do Automóvel Clube do Brasil e da Escola de Música da Universidade do Brasil, hoje UFRJ, ambos com gabarito menor e tombados pelo IPHAN, O projeto posterior apresentado à Prefeitura era de um Shopping Center de cinco andares além de garagens subterrâneas ocupando 100% do terreno.  

Academia Brasileira de Ciências nunca tomou posse do terreno, nem tinha meios de começar a obra e chegou a mover uma ação de despejo sem nenhuma justificativa plausível. A Academia que já possuía sede no Rio e em Brasília solicitou por várias vezes a prorrogação da cessão sob regime de aforamento, a última em 1999. Neste período, de 1984 a 1999, travamos várias batalhas para defender nossa localização, com movimentação de alunos, professores, membros da reitoria, personalidades da política e da sociedade civil.

Cartunistas famosos, senadores da república, candidatos a governador e a prefeito, bem como vereadores atuantes nos prestavam solidariedade e apoio. Os ministros e governadores da época receberam uma enxurrada de cartas e telegramas, das mais diversas personalidades, do Brasil e do exterior, protestando e conclamando-os a devolver a propriedade do terreno para a ESDI e sem resultado. Neste meio tempo foram tentadas novas localizações para a ESDI, com o suporte de vários de nossos reitores, e por esforço de sucessivos diretores, todas sem sucesso. O terreno foi declarado tombado e de utilidade pública, mas isso também não deu em nada.
A ESDI foi condenada a se manter dentro de seus limites, sem possibilidade de crescimento ou expansão, por mais de 20 longos anos!

O processo começou a se reverter com uma carta enviada pela reitoria ao então presidente Fernando Henrique Cardoso, ao final de seu mandato e reenviada ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, logo que tomou posse, este em seu primeiro mandato. Foram dadas instruções ao então Ministro do Planejamento Guido Mantega que a partir destes argumentos efetuou a rescisão do contrato de cessão. Achamos então que finalmente tínhamos vencido a guerra, pois as instruções do ministro ao Patrimônio da União era que expressamente se fizesse a cessão à UERJ.

Ledo engano, nestes últimos anos, inúmeros adiamentos e prorrogações nos levaram a quase achar que tínhamos na verdade perdido nossa última batalha. A especulação imobiliária estava de olho neste pedaço valioso de chão! As cobranças aos nossos reitores não cessaram por parte da direção da ESDI. As reuniões com o Patrimônio e outras entidades foram se repetindo “ad nauseum” e nada andava. Eis que finalmente uma luz surgiu no túnel com as discussões, dos últimos meses de 2013 e que muitos já conhecem.

Finalmente, recebemos a boa notícia pela qual, muitos de nós, ficamos de cabelos brancos. A ESDI venceu! Esperamos agora que ela possa crescer e se desenvolver como merece a primeira instituição ensino de nível superior de design da America Latina!

E como certamente diria Aloísio Magalhães, um dos seus fundadores, se vivo fosse: 

VIVA! VIVA a ESDI!
Texto não publicado.


quarta-feira, 26 de março de 2014

Por que mais um banquinho?

Recentemente, ao apresentar a um amigo um projeto que tivemos a oportunidade de fazer, uma série de banquinhos /mesinhas de uso residencial, tive que responder a pergunta: Porque mais um banquinho? Não acha que temos banquinhos demais?

A pergunta faz sentido, especialmente em uma época onde temos uma super oferta de produtos em nossa sociedade. Outro amigo e colega, designer e professor de design renomado tem colocado estas questões em discussão. Devemos criar mais produtos?  Deveríamos, ao invés, eliminar produtos de nossa realidade, tão carregada de elementos supérfluos e com isso reduzir o desperdiço que sobrecarrega nosso meio ambiente?

Este projeto nasceu de uma solicitação da entidade patronal local, que visava estimular a indústria de mobiliário a adotar o design como ferramenta competitiva. Uma empresa tradicional, bem equipada, mas com o mercado de atuação voltado para mobiliário especial ou sob medida, foi nos designada para atendimento. Em uma primeira visita constatamos que a empresa possuía algumas características marcantes e que poderiam ser exploradas no projeto que iríamos fazer. Com sua produção voltada para peças sob medida, produz muitos retalhos de matéria prima, que são zelosamente guardados e identificados. Sua linha de equipamentos incluí uma maquina CNC, de ultima geração, um centro de usinagem para chapas, com poucas horas de uso efetivo na produção. Além disso, a empresa possuí um setor de pintura e laqueamento de alto nível de acabamento, também com uso moderado na produção.

A empresa atua especialmente no setor de moveis de estar, com peças próprias e de outros fabricantes que comercializa em suas lojas.  Refletindo sobre este setor contatamos que nestes últimos tempos houve uma verdadeira revolução nos ambientes de estar com o advento das TVs planas e de grandes dimensões, que se popularizaram com a constante queda de preços. Com isso as televisões voltaram para as salas, já que antes freqüentavam os quartos individuais e passaram a reunir mais pessoas para apreciar filmes, DVDs, ou programas esportivos da TV a cabo, por exemplo. Um maior numero de pessoas reunidas exige mobiliário adequado, como assentos adicionais eventuais ou mesmo mesinhas de apoio para drinks, petiscos, pipoca, etc. durante as seções de TV. Sem falar na violência urbana que tem feito as pessoas ficarem mais em casa.

A partir destas considerações é que surgiu o conceito de UNI, DUNI, TÊ. Um conjunto de peças, que utiliza, sempre que possível, retalhos de uma produção, uma maquina sofisticada e flexível que praticamente executa todas as operações de produção e um processo de acabamento de alto valor agregado, que permite inúmeras opções de acabamentos. As peças possuem detalhes de acabamento, de montagem de detalhamento que lhes dão uma personalidade marcante: alturas diferentes, três pés, furos de identificação na superfície, grande flexibilidade de uso. Eles geram a pergunta óbvia: serão mesas ou banquinhos? Ou os dois??? Há uma questão ai colocada, que inclui um certo humor no tratamento e no uso das cores, tornando os únicos e divertidos.

 Claro que há outros banquinhos bons e divertidos no mercado. Mas a empresa precisava de produtos que fossem fáceis de produzir e comercializar e que os convencessem que design valia à pena. Porque então não explorar este nicho, com as facilidades já instaladas, concorrendo para tender a uma necessidade nova e de forte potencial de mercado e que, diga-se de passagem, não era bem atendida pelos produtos existentes.

 Produtos devem ser adequados a sua época, atender as necessidades do usuário e ter características de flexibilidade no uso e na aplicação. Todos têm um prazo de validade, que nos dias atuais se torna cada vez mais curto. Justamente por causa do surgimento de novos produtos e novas necessidades, é que há uma verdadeira “evolução das espécies”, que suplanta produtos existentes que por sua vez deixam de ser produzidos. Essa é a realidade deste nosso tempo.


Enquanto houver necessidades novas, novos banquinhos/mesinhas serão produzidos. mais adequados ao seu tempo. Somente sua difusão e seu uso constante, dirá se são adequados ou não!

UNI, DUNI, TÊ estão ai para isso! 

Exibidos na expo RIO+Design em Milão, Itália por ocasião do Salone del Mobile 2014. 
Fabricados por Elon Móveis de Design - Petrópolis, RJ.


Texto não publicado