Design é qualidade, é conhecimento, é cultura.
Design serve para melhorar a vida, adicionando valor a nossa cultura material. Neste espaço queremos discutir alguns destes tópicos, especialmente em relação a realidade brasileira.

terça-feira, 31 de maio de 2011

A nova Regulamentação do Designer – Um relato resumido

Com a veiculação recente, da apresentação no Congresso Nacional de um novo projeto de Lei de Regulamentação Profissional do Designer, foram publicadas inúmeras manifestações na internet versando sobre o processo de elaboração deste projeto. Grande parte delas é fruto de desinformação, sobre os fatos, sobre a articulação, a motivação e o processo que levaram a esta elaboração. Com o intuito de esclarecer alguns destes itens e na qualidade de um dos participantes deste último, elaboramos o texto que se segue, com o intuito de esclarecer este processo, uma grande dúvida entre nossos colegas:


Em 2007 por iniciativa de alguns profissionais de design renomados, foi constituído um Comitê com o intuito de propor um novo projeto de lei que regulamentasse a profissão de Designer. O projeto anterior de 2003, que propunha a regulamentação do Desenhista Industrial, tinha sido arquivado pelo Congresso Nacional naquele ano, sem possibilidade de prosseguimento de tramitação. Este Comitê foi constituído de representantes das principais organizações profissionais atuantes no país como a ADG Brasil/SP, ADP/SP, Adegraf/DF, APDesign/RS, APD/PE, AEnd/BR além de representantes da PUC/PR, do IED/SP e da ESDI/UERJ.

Reuniu-se pela primeira vez nos dias 18 e 19 de maio de 2007 em São Paulo na sede da Escola Panamericana de Arte e Design, onde iniciou os trabalhos de elaboração do projeto de lei a ser encaminhado ao Congresso. Partimos de uma revisão de proposta, já realizada, pela ADG Brasil, do projeto do PL nº 03515/89 – apresentado pelo então Dep. Maurílio Ferreira Lima - PMDB/PE. O PL de 1989, regulamentava a profissão de Designer, era por todos considerado o melhor já apresentado ao Congresso, e foi arquivado por ocasião do impeachment do Pres. Collor. O comitê reuniu-se novamente, no mesmo local, em 15 e 16 de junho, e após intensas discussões foi fechada uma proposta definitiva de projeto de lei, que foi apresentado a cada uma das associações e aprovado por unanimidade. Pela primeira vez temos um projeto de consenso de regulamentação de nossa profissão.


Este projeto foi encaminhado ao Dep. Jorge Bittar – PT/RJ que se comprometeu a dar-lhe andamento. Foi feita por ele uma consulta à assessoria parlamentar do Congresso que reiterou a sumula existente, rejeitando a regulamentação de novas profissões, segundo instruções do Ministério do Trabalho. O projeto não teve andamento, pois o Dep. Bittar foi nomeado Secretário de Habitação da Prefeitura do Rio de Janeiro, não o reencaminhando a outro parlamentar. Desde as eleições de 2010, membros deste comitê procuraram outros parlamentares que se dispusessem a reapresentar nosso projeto. Tivemos a concordância do Dep. Alessandro Molon – PT/RJ e do Dep. Jose Luiz de França Penna – PV/SP que foram abordados independentemente, por membros diferentes do nosso Comitê. No dia 18/05/2011 foi apresentado pelo Dep. Penna o PL nº 1391/2011 à Câmara dos Deputados e que nada mais é que o nosso projeto original, mencionado acima. É a primeira vez que temos um projeto em tramitação de consenso da classe, e que se devidamente trabalhado pode ser aprovado, finalmente.


Esta matéria é apenas encaminhada às Comissões de Constituição e Justiça, de Educação e do Trabalho, onde tendo pareceres favoráveis é aprovada e encaminhada a sanção presidencial, passando ainda pelo Ministério do Trabalho, mas sem passar pelo plenário. Temos que acompanhar este andamento e pressionar nossos parlamentares a aprovar o projeto, bem como envidar esforços junto ao executivo afim de que ele não seja vetado, ao final, quando encaminhado a sanção.


Temos um caminho longo e difícil pela frente, já que há uma sumula contrária a novas regulamentações, há interpretações de que regulamentar é inconstitucional, há resistências do executivo a estes processos, mas por outro lado, nestes dois últimos governos diversas profissões conseguiram sua regulamentação com pressões e “Lobby” bem feitos. Estamos elaborando uma estratégia a ser seguida e necessitamos da colaboração e contribuição de todos neste processo.


Nossas associações, por exemplo, precisam ser reforçadas e prestigiadas com a entrada de novos sócios, engrossando-se assim o numero de representados, fator crucial de pressão sobre a nossa classe política. Números sempre falam alto em termos políticos, como todos sabemos! Esperamos que cada designer atuante deste pais possa contribuir para o êxito deste processo!

Nós designers o merecemos!!!


Leiam mais e cadastre-se para seguir a tramitação em:
http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=502823

Leia mais em:
http://www.deputadopenna.com.br/site2011/?p=376

e em:
http://www.designbrasil.org.br/designnapratica/regulamentacao-do-designer-quem-interessa









Texto publicado no “Sinal" No. 402 de 30/05/2011

Um comentário:

  1. Bem... que bom que vocês reuniram essas informações num post, ótima iniciativa, embora eu ainda prefira a profissão não-regulamentada.
    [ ]s!

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Design e a miopia estratégica

O pais vive nesta virada do ano uma época de euforia, a economia estabilizada, a oferta de empregos, as exportações, as descobertas de petróleo, o IDH, as vendas de natal, estão fazendo todos enxergarem um futuro cor de rosa.

Simultaneamente continua havendo uma visão truncada quanto a nosso desenvolvimento industrial, especificamente no que se refere ao design. Quando foi criado o Programa de Qualidade e Produtividade esqueceram de incluir o design, o que não aconteceu em qualquer outro pais do mundo. Mais tarde criaram o Programa Brasileiro do Design para concertar o erro, uma iniciativa claudicante de governos passados e que mesmo no governo atual nunca conseguiu dizer a que veio. Mais recentemente na divulgação do PAC da Inovação novamente esqueceram do assunto já que no seu texto não há uma palavra sobre design. Falou-se de patentes, de inovação mas o design foi solenemente ignorado, como se ele não fosse parte da tecnologia e da inovação.

O descaso com o design por parte das federações de indústria e do comércio e de nossa classe política beira o absurdo, e nas raras ocasiões onde se manifestam sobre o assunto parecem estar fazendo favor ao design e aos designers. Nossa classe dirigente ignora solenemente o potencial de valor agregado que o design pode trazer para nossa produção, em todos os níveis.

Por outro lado o Design Excellence, uma iniciativa da Apex, que organiza nossa participação no If da Feira de Hannover continua premiando o design brasileiro no exterior, além de outros 30 concursos regulares de design, dão visibilidade de inegável qualidade ao design nacional. Apenas as indústrias multinacionais e algumas empresas nacionais mais iluminadas tem se beneficiado da qualidade do design nacional, o que também atesta nossa capacidade na área. Apesar disso não encaramos o design como um fator estratégico do desenvolvimento industrial, como o fazem Coréia, a China, e o Japão mais recentemente e a Alemanha, Itália, o Reino Unido e os paises escandinavos na metade do século passado.

Até quando o governo vai ignorar o design como estratégia? Até quando o pais vai teimar sistematicamente em não utilizar deste instrumento de desenvolvimento? Até quando vamos dispensar o fator de geração de valor agregado mais barato e eficiente que existe? Até quando vamos deixar de nos beneficiar de utilizar o design como fator de melhoraria de nossa produção e de nossa qualidade de vida?

A maioria do empresariado de capital nacional precisa corrigir sua miopia crônica em relação ao design. Necessitamos com urgência de uma verdadeira cirurgia para eliminar a miopia estratégica a respeito do design em nossa classe dirigente e em nosso meio produtivo. Não há óculos que dê mais jeito!!

Texto publicado no Site http://www.abedesign.com.br/
05.2008



O legado de José Carlos Bornancini (1923-2008)

Quem não tem ou teve um produto desenhado por Bornancini em casa? Uma tesoura Ponto Vermelho, uma faca Corte Laser, uma garrafa térmica Termolar ou quem sabe foi alimentado pelos pais com o Talher Criança.? Quem valida seu Cartão nos ônibus do Rio de Janeiro e de outras cidades, não deve saber que diariamente entra em contato, até por mais de uma vez, com um produto desenhado por este pioneiro do design brasileiro.

Este engenheiro por formação, professor e designer por opção conseguiu nos demonstrar que o design brasileiro tem qualidades, respeitadas inclusive no exterior, muito antes de termos profissionais aqui formados e antes ainda da atual fase de reconhecimento pela qual, afinal, estamos passando. Sozinho, com seu sócio ou liderando equipes, desde os anos 50, conseguiu superar as resistências atávicas do industrial de capital nacional (e multinacional) a melhorar seu produto com um projeto coerente, racional, ergonômico e também belo quando era necessário, isso sempre sem cópia. Ao contrario demonstrou que o nosso produto por ser bom, pode ser copiado, já que teve inúmeros casos de contra-facção de seus projetos inclusive na Alemanha, berço histórico do bom design.

Bornancini e Nelson Petzhold estiveram na ESDI em maio de 2003 e proferiram a aula inaugural onde falaram de seu trabalho, enfatizando o uso da percepção visual, o foco na inovação e na coragem de inovar, como forma de contribuir para um mundo melhor.

Bornancini nos deixou, no dia 24 de janeiro. Com ele se foram muitas boas idéias, muitos ensinamentos, a companhia sempre agradável de uma verdadeira unanimidade, e algumas das mais divertidas tiradas sobre nós mesmos e nossa sociedade.
Bornancini nos deixou a crença que, se tudo que ele realizou em sua época foi possível, será possível levarmos o design brasileiro no futuro ao respeito que ele merece, mas sem nunca perder o humor!

Foi uma honra e um privilegio enorme termos convivido com Jose Carlos Bornancini.

Texto publicado no newsletter "Sinal" http://www.esdi.uerj.br/sinal - Janeiro 2008

Um Design Onírico?


Em uma segunda feira de sol radiante eu me preparava para subir no avião com destino a São Paulo e me perguntava porque estávamos ali na pista, quando todos os “fingers” do Santos Dumont, recém reformado, estavam ociosos. Perdoei o fato pelo sol de outono que tínhamos a nosso dispor, sabendo o tempo que iria encontrar na capital paulista. Me ajeitei na poltrona do corredor que sempre utilizo quando um senhor, elegante e bem vestido, me pede licença para sentar na poltrona da janela destinada a ele.

O avião levanta vôo e admiramos a paisagem esplendida do Rio em sobrevôo matinal, que sempre deixa qualquer um de boca aberta. O senhor me da um sorriso e faz um comentário sobre o design da cidade, o que me apresso a concordar pois este é meu terreno. O design e o Rio. Faço alguns comentários sobre a qualidade do nosso design, ele me pergunta o que faço e relato brevemente minha atuação de meio designer e meio professor. Ele me diz que a sua empresa se utiliza muito do design e se apresenta como Manuel, de sobrenome indecifrável, presidente da GM do Brasil.

Admirado me animo com a conversa, já que conheço o departamento de design da empresa, onde por coincidência, trabalha um ex-aluno nosso e com os quais tivemos vários contatos. Até desenvolvemos no passado projetos em conjunto com nossos alunos, com suporte da empresa , como um interessante projeto de interior de automóvel destinado ao publico feminino. Somos interrompidos pelo serviço do micro lanche do serviço de bordo e comento que já tivemos dias melhores na Ponte Aérea. Ele ri e menciona que sabíamos administrar e contornar melhor a escassez típica de um país em desenvolvimento.

A conversa continua animada e pergunto por projetos atuais, nestes tempos de crise, de escassez de recursos, de excesso de cautela, de paralização de idéias. Ele me responde que estamos numa época de expectativas, enrola um pouco o papo e percebo que não pode revelar idéias corporativas. Para enfatizar meus argumentos, e dar uma de cara informado, relembro a ele que o departamento de design da empresa dele já teve atuação destacada em projetos de sucesso, como o Celta e o Prisma, por exemplo, que são projetos inteiramente nacionais e que até geraram um novo modelo de produção. Relembro a frente do projeto Sabiá, uma “pickup” conceitual apresentada em salões do automóvel internacionais e que foi aplicada em toda a linha Opel, da época. Falo das sucessivas remodelações da linha Corsa e Astra bem como de outros projetos pontuais que sustentam a imagem da empresa no Brasil e no exterior além do excelente estúdio de realidade virtual que possui atualmente.

Animado, faço ainda algumas considerações sobre designers brasileiros de empresas concorrentes, como a Volkswagen e da Fiat que atuam com sucesso no exterior e de novos players no mercado brasileiro, como os franceses que recentemente estabeleceram centros de design no Brasil. Ele se mostra impressionado com o meu entendimento do assunto e concorda com a nossa eficiência em termos de design automobilístico. Eu, meio bobo com meu desempenho, começo a extrapolar e coloco em questão o fato de não entender porque não temos uma montadora de capital verdadeiramente nacional, onde o design brasileiro fosse reconhecido, plenamente. Ele então, não se contendo, se aproxima de mim, por sobre a poltrona do meio vazia, e me confidencia em voz baixa que talvez estivéssemos próximos disso naquele exato momento. Dá a entender que a filial nacional da GM esta para ser vendida a um forte grupo nacional, neste processo de concordata que a GM americana está vivendo. Sem ser muito explicito dá a entender que está indo negociar o fato naquele dia. Eu o encaro meio atônito por ter me revelado este segredo e fico cheio de esperança, imaginando que nosso design automobilístico finalmente poderá ter o reconhecimento que os japoneses, os coreanos ou mesmo os recém chegados indianos e chineses, tem, mesmo tendo começado muito depois de nós.

Nos aproximamos de São Paulo e o aviso dos cintos e dos aparelhos eletrônicos proibidos ecoa pelo avião. Trocamos cartões e finalmente vou decifrar aquele nome inaudível lá do começo. Quando fixo meus olhos míopes no cartão, percebo estar sem óculos e começo a ouvir um ruído estranho e persistente.

Me assusto muito pois parece um ruído de emergência e a repercussão de uma tragédia aérea recente ainda está presente na memória. Descubro ao mesmo tempo aliviado e decepcionado que é o meu celular me despertando para um novo dia de trabalho onde vou encarar mais uma turma de alunos, tendo que convencê-los que fazer design no Brasil vale a pena. Será um sonho? Coloco os óculos e me levanto, como faço todas as amanhãs.

Texto não publicado - Junho 2009