Mesmo com o progresso nos processos de manufatura, com a
divulgação pelas redes sociais, com a existência de bons exemplos mundiais,
neste início de século XXI continuamos a regredir em áreas onde isso não seria
concebível. O setor de mobiliário popular é um deles. Nos dias de hoje o mobiliário popular, que é oferecido ao
consumidor brasileiro é pior do que em meados do século passado, tanto em
design como em qualidade.
Este raciocínio nos ocorreu logo após a notícia do
falecimento de Ingvar Kamprad, há poucas semanas, o fundador e presidente da
rede de lojas IKEA, espalhadas pelo mundo. A IKEA foi uma das precursoras da
difusão do móvel popular qualidade pelo
mundo, iniciado no final dos anos 60, junto com a Habitat, esta de origem
britânica, e que hoje faz parte da rede IKEA. Estes dois exemplos mudaram o
paradigma do que é um móvel popular, de preço justo, mas com funcionalidade,
design e qualidade, para atender a um publico diferenciado, nascido no pós-guerra. A IKEA nasceu em uma pequena cidade do interior da Suécia e
se tornou a maior rede de venda de móveis e acessórios para a casa do mundo, com 400 lojas e presença em todos os continentes, menos na América do
Sul. Kamprad foi o milionário europeu que frequentou o primeiro lugar do
ranking por longos anos. Sua filosofia de vida foi que norteou a fundação da
empresa e a feição de seus produtos, que tiveram sucesso quase que instantâneo.
Ele percebeu a emergência de uma classe popular de consumidores com necessidade
de mobiliário de qualidade, mas com preços populares.
O interessante é que nos anos 70 houve um interesse da IKEA
e da Habitat (então ainda independente) em vir para o Brasil, como um inicio de
uma possível operação em nosso continente. Estiveram aqui em missão
exploratória mas desistiram após alguns estudos. Já operava em algumas cidades
brasileiras uma cópia delas, a rede Tok&Stok, com produtos muito
semelhantes mas a preços muito mais caros, comparativamente, aos praticados por
eles em suas redes. A proibição de importar peças de mobiliário praticada na
época foi um dos fatores que os impediram de ir a frente. Isso significaria
produzir todo o seu catalogo aqui, e com nossos custos inflacionados, o que
impediu a viabilidade do negócio. Isso também impediu que nos tornássemos
fornecedores deles, mesmo havendo algumas iniciativas de empresas nacionais, o
que detalharemos em outro post. Este é um dos exemplos internacionais a que nos referimos no
início. Se estas tentativas tivessem se concretizado, poderíamos ter outro
patamar de qualidade de mobiliário e acessório, atendendo ao nosso consumidor
popular. Certamente estabeleceria um novo paradigma para o setor.
O que temos hoje é abaixo da critica. Um mobiliário popular
construído com péssimo design, acabamento pífio, detalhamento abaixo de
qualquer critério, que não suporta o uso diário, nem uma mudança sequer, sem
possibilidade de manutenção, com materiais e acabamentos que não suportam um
copo molhado, sobre um tampo de mesa. O resultado é que há uma invasão de
produtos chineses de baixo custo competindo com o produto nacional, com sérios
problemas para a indústria local. Uma indústria que sempre teimou em
privilegiar custo sobre qualidade, nivelando assim seu mercado pelo menor nível
possível, hoje sofre as consequências. Não criamos uma cultura da qualidade, o
que dirá do design.
O design de nosso mobiliário peca por uso de placas de MDF
com revestimento de péssima qualidade. Itens desmontáveis, mas com ferragens de
baixa resistência e com acabamentos de parafusos aparentes, com capinhas que se
desprendem e se perdem facilmente. Excesso de cromados e parafusos aparentes, no
mobiliário metálico, com tubos de espessuras inadequadas, facilmente
deformáveis ao se arrastar uma mesa. Cadeiras com acabamentos em chapa metálica
sem o necessário desbaste, ocasionando bordas cortantes, além de estofamentos
de baixa qualidade e conforto.
Quando os móveis são de madeira há exemplares de cadeiras
pesadas demais, para um reles mortal, ou leve demais para se confiar em sentar
nelas. Mesas de diversas alturas, com travessas que não permitem ao usuário
sequer cruzar as pernas. Quanto aos
armários fazem o maior efeito enquanto vazios. Ao serem carregados temos logo o
efeito das prateleiras vergando e das portas empenadas e sem fechar se faz
sentir, fruto do mau dimensionamento das placas utilizadas e de sua resistência.
No caso dos estofados as dimensões são tão estapafúrdias que dificilmente
caberão numa sala de Minha Casa Minha Vida!
Basta fazer uma turnê por uma rua de lojas de mobiliário
popular, em qualquer cidade brasileira para se constatar estes fatos. A
pergunta que fazemos é será que o consumidor popular tem que pagar este preço e
ter um produto que já sai da loja com prazo de validade? Não há a possibilidade
dos órgãos de normalização ou de defesa do consumidor fiscalizar estes produtos
e dar-lhes uma classificação, que sirva para o consumidor saber o que está
comprando? Como é realidade em outros países?
O suado dinheiro do consumidor popular deve ser protegido
deste tsunami de baixa qualidade que lhe é oferecido. O nosso consumidor
popular, merece ter um retorno de qualidade e o design tem um papel fundamental
na geração de produtos que durem alguns anos a mais, além da duração das suadas
prestações que ele paga.
A indústria e o comércio de mobiliário popular tem que tomar
consciência urgente disso, para sobreviver e atingir patamares de maior valor
agregado, fornecendo produtos melhores a população brasileira.
Texto não
publicado
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