Fala-se constantemente em inovação, nas escolas, na imprensa, nos seminários, nas “lives” tão comuns neste período de pandemia. Os filósofos e os gurus da economia e da administração, os jornalistas especializados, deles só ouvimos o mote que a inovação é a pedra de toque da sobrevivência.
Em um país em desenvolvimento como o nosso há uma necessidade de novos projetos, de planejamento, do uso dos parcos recursos de que dispomos da forma mais racional e inovativa possível. Mas nós acreditamos verdadeiramente nisso???
Inovação pressupõe talento, estudo, pesquisa, risco, iniciativa. Mas pressupõe também capital, tempo, formação, mercado, fomento e credibilidade!
Na área do design, podemos dizer, que tudo o que foi elencado na primeira parte dessa frase está presente em nossa realidade, até mesmo com sobra. Falta-nos é a segunda parte e sem ela não conseguiremos sobreviver.
Fico impressionado com o desperdício de idéias, de projetos, de possibilidades já desenvolvidas e que desprezamos sem a menor cerimônia. Nas escolas e faculdades de design se pratica a disciplina de projeto, como espinha dorsal. Todos os graduados têm que apresentar um projeto de graduação, um TCC, como é conhecido. As prateleiras destas instituições estão lotadas destes projetos, muitos de excelente qualidade e que nunca tiveram a chance de chegar ao meio produtivo, ao mercado.
Os concursos de design, que realizamos há décadas, apresentam, projetos, idéias, produtos da mais alta qualidade. Muitos são premiados, mas também tem vida curta, não chegam ao meio produtivo, ou quando chegam duram pouco, por razoes que desconhecemos. Assim com nas leis, no Brasil há projetos “que pegam” e outros que não pegam. Mesmo que sejam melhores. Há inclusive produtos de sucesso que somem, sem explicação.
Há alguns anos a revista “Industrial Design” americana elogiou uma de nossas embalagens, o saquinho de leite! Argumentou que era um exemplo de solução menos poluente, mais inteligente e mais racional que os “packs” utilizados no seu país. Considerou que isso demonstrava que um país jovem como o nosso, aprendia dos erros por eles cometidos. Hoje não temos mais o saquinho, exceto em alguns casos excepcionais e temos uma montanha de “packs” depositados em nossos lixões e no oceano.
Parece que nós nos “cansamos” de ter uma boa idéia e depois de um tempo a descartamos, sem memória. Isso já aconteceu com produtos “brazucas” reconhecidos aqui e lá fora também. Dois produtos publicados e premiados fartamente e que nos orgulhavam como símbolos de nossa inteligência sumiram de nossas prateleiras, sem explicação. O filtro para água, uma versão moderna do celebrado filtro de barro, da Ceramica Stefani desenvolvido pela DAP Design do Roberto Brazil e do Oswaldo Solla, foi amplamente premiado aqui, tendo ainda recebido o IF Design Award na Alemanha, em 2004. Foi comercializado por um tempo e depois descartado pela empresa, sem nenhuma explicação. Outro exemplo é a jarra para água DUE, produzida pela Coza, que foi premiada em 2006 no MCB Premio Design do Museu da Casa Brasileira. Com design de Valter Bahchivanji, tem a característica de uma tampa, que abre e fecha, dependendo de sua colocação, mas seu formato é tão inteligente que cabe na geladeira de forma a desocupar espaço. Foi distribuída por algum tempo e depois sumiu do mercado. Não há disponíveis jarras com este formato e características, deste ou de outro fabricante, infelizmente O que se percebe é que não acreditamos no que nós mesmos produzimos.
Enquanto isso, há produtos que se tornam ícones e mesmo com o passar dos anos continuam a existir e a serem considerados ótimos. A poltrona Mole, do designer brasileiro Sergio Rodrigues de 1956 é um exemplo. Foi lançada e somente teve sucesso, depois de receber premio na Itália. Teve 16 copias produzidas por concorrentes, registradas pelo criador, foi quase descontinuada e ressurgiu com todo vigor, sendo um item obrigatório em projetos de decoração contemporâneos, mesmo 65 anos depois.
A nossa cultura material precisa de inovação. Mas precisamos, antes de mais nada, entender que inovação tem que ter quem acredite nela. As decisões sobre se um produto nasce ou morre são, na maioria das vezes tomadas por quem os produz, com critérios nem sempre adequados a cada caso, sem uma visão holística.
Mas sempre com um olho, ou os dois, no lucro! O único critério que serve para nossa classe produtora!!! Será que por isso descartamos tantas idéias com potencial??? Até quando desperdiçaremos projetos, por não termos claro qual a sua projeção?
Até quando deixaremos de acreditar no que projetamos???
Após a publicação deste texto constatamos que a Jarra para água DUE continua em produção. Foi encontrada escondida, no catalogo da Coza/Brinox, agora sem este nome e disponível em uma nova versão, transparente. O problema é que originalmente era produzida em polipropileno, em diversas cores e passou a ser produzida em poliestireno. Isso a torna muito mais frágil e impede de ser utilizada em maquinas de lavar ou microondas, como anteriormente. O exemplar encomendado pela internet nos chegou já danificado pelo transporte, mesmo estando bem embalado, o que não aconteceria ser produzida no material original.
ResponderExcluirÉ o lucro, idiota!!!
Fred muito obrigado por sua fala sobre nosso trabalho !!!! O que resta hoje é uma tristeza muito grande ... depois de ter feito vários projetos para AOC (incluindo produção mundial), TECTOY onde cuidei do Design de vários produtos, desde sua fundação, DIXTAL onde desenvolvi vários equipamentos, incluindo um Monitor de sinais vitais que aparece em todas as novelas ou reportagens sobre UTIs nesta pandemia, sem contar que desenvolvemos a primeira urna eletronica que hj está sendo criticada por este cara !!!!!! Grande abraço
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