Design é qualidade, é conhecimento, é cultura.
Design serve para melhorar a vida, adicionando valor a nossa cultura material. Neste espaço queremos discutir alguns destes tópicos, especialmente em relação a realidade brasileira.
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segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Projetos e projeções

Fala-se constantemente em inovação, nas escolas, na imprensa, nos seminários, nas “lives” tão comuns neste período de pandemia. Os filósofos e os gurus da economia e da administração, os jornalistas especializados, deles só ouvimos o mote que a inovação é a pedra de toque da sobrevivência. 

Em um país em desenvolvimento como o nosso há uma necessidade de novos projetos, de planejamento, do uso dos parcos recursos de que dispomos da forma mais racional e inovativa possível. Mas nós acreditamos verdadeiramente nisso??? 

Inovação pressupõe talento, estudo, pesquisa, risco, iniciativa. Mas pressupõe também capital, tempo, formação, mercado, fomento e credibilidade! 

Na área do design, podemos dizer, que tudo o que foi elencado na primeira parte dessa frase está presente em nossa realidade, até mesmo com sobra. Falta-nos é a segunda parte e sem ela não conseguiremos sobreviver. 

Fico impressionado com o desperdício de idéias, de projetos, de possibilidades já desenvolvidas e que desprezamos sem a menor cerimônia. Nas escolas e faculdades de design se pratica a disciplina de projeto, como espinha dorsal. Todos os graduados têm que apresentar um projeto de graduação, um TCC, como é conhecido. As prateleiras destas instituições estão lotadas destes projetos, muitos de excelente qualidade e que nunca tiveram a chance de chegar ao meio produtivo, ao mercado.  

Os concursos de design, que realizamos há décadas, apresentam, projetos, idéias, produtos da mais alta qualidade. Muitos são premiados, mas também tem vida curta, não chegam ao meio produtivo, ou quando chegam duram pouco, por razoes que desconhecemos. Assim com nas leis, no Brasil há projetos “que pegam” e outros que não pegam. Mesmo que sejam melhores. Há inclusive produtos de sucesso que somem, sem explicação. 


 Há alguns anos a revista “Industrial Design” americana elogiou uma de nossas embalagens, o saquinho de leite! Argumentou que era um exemplo de solução menos poluente, mais inteligente e mais racional que os “packs” utilizados no seu país. Considerou que isso demonstrava que um país jovem como o nosso, aprendia dos erros por eles cometidos. Hoje não temos mais o saquinho, exceto em alguns casos excepcionais e temos uma montanha de “packs” depositados em nossos lixões e no oceano. 

Parece que nós nos “cansamos” de ter uma boa idéia e depois de um tempo a descartamos, sem memória. Isso já aconteceu com produtos “brazucas” reconhecidos aqui e lá fora também. Dois produtos publicados e premiados fartamente e que nos orgulhavam como símbolos de nossa inteligência sumiram de nossas prateleiras, sem explicação. O filtro para água, uma versão moderna do celebrado filtro de barro, da Ceramica Stefani desenvolvido pela DAP Design do Roberto Brazil e do Oswaldo Solla, foi amplamente premiado aqui, tendo ainda recebido o IF Design Award na Alemanha, em 2004. Foi comercializado por um tempo e depois descartado pela empresa, sem nenhuma explicação. Outro exemplo é a jarra para água DUE, produzida pela Coza, que foi premiada em 2006 no MCB Premio Design do Museu da Casa Brasileira. Com design de Valter Bahchivanji, tem a característica de uma tampa, que abre e fecha, dependendo de sua colocação, mas seu formato é tão inteligente que cabe na geladeira de forma a desocupar espaço. Foi distribuída por algum tempo e depois sumiu do mercado. Não há disponíveis jarras com este formato e características, deste ou de outro fabricante, infelizmente O que se percebe é que não acreditamos no que nós mesmos produzimos.


Enquanto isso, há produtos que se tornam ícones e mesmo com o passar dos anos continuam a existir e a serem considerados ótimos. A poltrona Mole, do designer brasileiro Sergio Rodrigues de 1956 é um exemplo. Foi lançada e somente teve sucesso, depois de receber premio na Itália. Teve 16 copias produzidas por concorrentes, registradas pelo criador, foi quase descontinuada e ressurgiu com todo vigor, sendo um item obrigatório em projetos de decoração contemporâneos, mesmo 65 anos depois.

A nossa cultura material precisa de inovação. Mas precisamos, antes de mais nada, entender que inovação tem que ter quem acredite nela. As decisões sobre se um produto nasce ou morre são, na maioria das vezes tomadas por quem os produz, com critérios nem sempre adequados a cada caso, sem uma visão holística. 

Mas sempre com um olho, ou os dois, no lucro! O único critério que serve para nossa classe produtora!!! Será que por isso descartamos tantas idéias com potencial??? Até quando desperdiçaremos projetos, por não termos claro qual a sua projeção? 

Até quando deixaremos de acreditar no que projetamos???

sexta-feira, 15 de maio de 2020

O ambiente de trabalho Pós COVID!


Quando a situação se estabilizar voltaremos a uma “nova normalidade”!?!?

Depois desta quarentena, que temos apoiado integralmente, muitos almejarão retornar a uma proximidade maior, mas terão receio ainda de contágio e propagação do vírus, já que não saberemos se o nosso interlocutor teve, ou não teve o COVID. O que fazer então???Tudo isso dependerá dos novos e futuros conhecimentos que teremos, ou tivermos sobre este vírus tão letal.

Decididamente não voltaremos como “antes”! Teremos um novo “modelo
.
Proposta divulgada para o retorno das aulas, em escolas da China.

Porem a economia precisa ser retomada, e o trabalho é que move a economia!
A primeira opção é como ter proximidade e como manter o distanciamento. Nos relacionamentos e isso terá que ser equacionado, especialmente no trabalho.

Já imaginaram se tivermos que nos paramentar daqui para diante como os profissionais de saúde estão se paramentando para podermos trabalhar??? Algumas profissões provavelmente terão sim que se paramentar, mas isso não poderá ser para a maioria.

O que nos resta? O trabalho remoto. Teremos que exercitar uma nova experiência de trabalho a ser ainda formulada. Cada um no seu canto, cada um na sua casa ou em novos ambientes, agora distanciados, mas pensados para a nova era.

Tentaremos transmitir aqui os aspectos relativos aos ambientes de trabalho específicos e de uso mais geral. Sabemos que isso tudo atende a uma camada de usuários e não é ainda nossa realidade universal, onde muitos não têm ainda acesso a internet publica e gratuita, o que já  passou a ser um divisor de águas em nossa sociedade, especialmente a partir de agora.

O verdadeiro início do século está acontecendo!

Já estamos preconizando o “home office” para todas as atividades de estudo, teóricas, administrativas ou burocráticas. Claro que há atividades práticas que poderão ser executadas no “home”, em casa! Mas onde, em casa, esta atividade se dará?

Nem sempre temos um escritório, um estúdio, um ambiente reservado para o trabalho. Não poderemos trabalhar, por longos períodos, na mesa da sala, da copa, ou acocorocados no sofá. São ambientes sociais, onde outras pessoas interagem e não pensados para o trabalho. Isso pode e deve estar acontecendo hoje, mas não é uma possibilidade para o futuro, muito menos para esta nova normalidade que está por vir.

O isolamento que já vivemos, com nossos “Headfones”, nossos computadores pessoais, tablets, Ipads vai ser exacerbado daqui para diante, especialmente em ambientes familiares. As crianças e adolescentes, com suas aulas remotas; a educação à distância, os jogos e lazer; o pai ou a mãe, com seus trabalhos e empregos e eventuais estudos ou os membros da família que forem empreendedores, todos se isolam grande parte do dia. Mesmo os de terceira idade, que queiram se comunicar com parentes ou com a realidade cada vez mais isolacionista que nos espera, por um bom tempo. Todos serão usuários destes “hardwares” que nos manterão em rede, com os “nós” de um metro e meio de distância! O trabalho em casa vai necessitar de uma nova realidade doméstica e vai modificar a nossa relação funcional e empresarial com o espaço de trabalho.

As empresas, com o resultado da experiência atual, vão querer continuar a economizar em espaços de trabalho. Muitos prédios de escritório perderão sua função ou serão reduzidos ao mínimo, já que o trabalho remoto será bastante utilizado. Os que restarem serão não só reduzidos e muito modificados. Se continuarem provavelmente terão que mudar seu layout, mobiliário e equipamento, o seu caráter.

Hoje em dia, já não há mais armários ou arquivos, pois se guarda tudo na memória das máquinas ou na nuvem. Haverá menos postos individuais de trabalho e mais mesas de reunião ou de trabalho coletivo, como em parte já ocorre. Mas agora ao invés dos escritórios panorâmicos, invenção dos anos 60/70, voltarão os espaços compartimentados, com divisórias, mantendo uma “gestão da distância” criando os possíveis isolamentos necessários. Precisaremos de mais locais com projeção e mais câmeras para comunicação à distância. Tudo que acelerar a produtividade deverá ser considerado.

Os que estiverem obrigados a trabalhar nestes locais, formando equipes pedirão mais “facilities” para o local; cantinas ou “coffeshops”; locais para descanso ou reuniões informais, eventualmente vestiários e academias para exercícios ou relaxamento e locais para abrigar bicicletas ou patinetes, em um novo meio de deslocamento. Estas facilities servirão como atrativos e compensação para retirar funcionários de suas casas, já que trabalhar remotamente ou de casa significara maior liberdade, mas em um ambiente fechado põem em risco a segurança para contágios.

Isso já vem sendo preconizado em empresas mais avançadas e no exterior, mas isso deverá ser adotado entre nós de forma mais abrangente. Locais para receber deliverys terão que ser pensados. Já há opções “contact less” que poderão se generalizar. Comer em restaurantes, com aglomerações será descartado por um bom tempo. Importantíssimo serão as facilidades tecnológicas, como excelentes redes de comunicação, facilidades de tele conferência, acesso a periféricos e suporte técnico, facilidades digitais de todo tipo, eletricidade, iluminação, acústica, refrigeração ou aquecimento, acesso a desinfecção, etc.

Um problema específico é o do condicionamento de ar destes ambientes. Todos os sistemas deverão ser repensados, ou substituídos, pois eles podem ser transmissores de contágio, ao longo de seu uso, mesmo que sejam tomadas todas as precauções, hoje já difundidas.
  
O resultado final é que vai haver, com certeza, uma re-significação espacial nos ambientes de trabalho.

Claro que o mobiliário, que terá que ser redesenhado, passará a ser um fator de conforto a ser considerado. Mesas com ajustes de altura, para atender a ergonomias diferentes; dispositivos de privacidade e acústica; disponibilidade de telas mais amplas, para tele conferencias, do que as atuais dos laptops; cadeiras ativas, confortáveis e ajustáveis, que já existem, mas deverão ser utilizadas de modo mais universal do que atualmente, especialmente no que se refere a seu custo. Teremos que replicar o “estar em casa” para tornar o escritório atrativo. Ajuda a manter a eficiência mesmo á distância!

No âmbito doméstico isso também se refletirá. A necessidade de mobiliário próprio para trabalho, com os suportes adequados as novas necessidades, internet mais confiável, no-breaks para falta de energia, suportes para câmeras e periféricos, isolamento acústico variável, ou permanente, que permita privacidade acústica e visual junto a outros familiares, além de tratar assuntos confidenciais, etc. Como haverá mais tempo disponível isso exigirá eventualmente até um espaço próprio e isolado para trabalho, um quarto ou as antigas dependências de empregada, semi isoladas do ambiente doméstico. Deve-se considerar que este espaço possa, equipado, ser utilizado por gerações diferentes e gêneros diferentes, em horários diferentes, cada um com suas necessidades especiais (ergonomia, materiais, suportes, etc.).

Não sei se os espaços de “co-working” hoje disponíveis e bastante populares, continuarão a se desenvolver como até aqui. O fenômeno das “startups” terá também uma modificação e os espaços hoje utilizados, talvez tenham que se adaptar a esta nova gestão da distância. As medidas de desinfecção serão também decisivas no design de todos esses espaços, exigindo materiais e acabamentos resistentes, que suportem este novo hábito, que vem sendo instalado entre nós.

Esta discussão entre escritório panorâmico e o “home office” já vinha sendo travada, desde os anos 70, por planejadores e sociólogos, especialmente na Alemanha, com defensores em ambos os lados. O aumento da população urbana, o distanciamento de casa para o trabalho, os congestionamentos diários, a mobilidade requerida pelo distanciamento, os fatores ambientais daí resultantes, forçaram a uma mudança que vem sendo implantada, mas muito lentamente. Foi preciso o advento da informática generalizada, primeiro e agora esta pandemia, para que ele realmente fosse levado a sério e acelerasse sua implantação de vez.

A descentralização, a economia no deslocamento, a necessidade de conforto familiar, além de tempo para o lazer, cada vez mais necessário, pode nos indicar e conduzir a uma profunda mudança nos nossos hábitos futuros. Isso, inclusive se refletira no futuro desenho de nossas cidades. O ”retrofit” de prédios atuais e a implosão de áreas ociosas inteiras, criando mais espaços de uso, podem ser resultados que veremos acontecer. Haverá, certamente, uma grande modificação no nosso meio ambiente construído, nestes próximos tempos.

Já há soluções indicadoras para muitos destes assuntos: Mesas de trabalho adequadas ao uso em residências, com acessórios componíveis, coisa que só encontrávamos em sistemas de escritório, já estão disponíveis, assim como cadeiras ativas de diversos modelos. Estes itens precisarão ser atualizados ou redesenhados com detalhes ou acessórios advindos da nova realidade normal: armazenadores de máscaras, suportes para álcool gel, porta luvas, etc. Sempre haverá um aspecto a ser revisto com o passar do tempo. Flexibilidade e multi-funcionalidade são aspectos que estão vindo à tona, novamente, para atender aos nossos novos anseios.

Há ainda outros ambientes de trabalho remoto que precisam ser estudados, o das costureiras, dos joalheiros, dos artesãos, dentistas e prestadores de serviços diversos, por exemplo, só para citar alguns, que necessitam de itens muito específicos de suporte. Mas isso deverá e poderá ser abordado em outra ocasião e em uma discussão mais abrangente.

A “nova realidade” do trabalho e de seu ambiente ainda precisa ser mais estudada!


Texto de palestra proferida "on line" para a UNIOESTE em 06/05/2020 a convite da Profª Luli Hata.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

LER, ou não LER eis a questão!

Já se foi o tempo em que fazíamos Design com papel, régua e esquadros! Hoje precisamos de hardware e software sofisticados e caros, além de muito treinamento e prática para realmente dominá-los. O uso indiscriminado da informática tem dominado nosso trabalho, não sabemos mais traçar um quadrado sem o computador e temos tal dependência deles que os utilizamos no trabalho, durante as refeições, no transporte e nas viagens, até na nossa cama, ainda mais agora com as famigeradas redes sociais.
Mas afinal isso tudo é trabalho? É lazer? É vício? Ou é tudo junto? Nosso trabalho, especialmente se formos Designers, nos condiciona a sermos umbilicalmente ligados a estas máquinas, em todas as situações. Os hardwares rapidamente têm evoluído e têm exigido novas posturas, novos hábitos. A evolução dos equipamentos de informática (Desktops/Notebooks/Netbooks/iPads/Tablets/Smartphones e o que vier proximamente) em cada caso, exige um tipo de suporte diferente, de formas de trabalhar diferentes, e de arranjos e layouts diferentes, no posto de trabalho.  

Sempre almejamos estar na crista da onda. Preferimos trabalhar com o que há de mais novo. Entretanto nem sempre o mais novo é o mais adequado a cada tarefa. Vejamos, por exemplo, o uso dos Notebooks versus o uso dos desktops. Há uma preferência natural pelos primeiros, já que parece que os “desk” estão superados, o que é um erro brutal de avaliação. Em Design o longo tempo de elaboração de layouts, dos renderings, pesquisas ou apresentações pedem telas grandes, diversos meios de acesso (teclado separado, mouse, tablet e caneta, HDs externos, câmeras, scanners, etc).

Em um Notebook isto não é fácil. Um “Note” serve para trabalhos eventuais, algo que precise ser feito “in situ”, levado para casa ou em viagens, como numa apresentação, conferência ou palestra. O Notebook é das maquinas menos ergonômicas que existem e as longas horas de projeto e desenvolvimento necessitam de boa postura e boa performance, que só um bom Desktop em uma mesa adequada e com uma cadeira regulável pode proporcionar. Pagamos uma fortuna pelas nossas maquinas e softwares mas esquecemos que elas são tão importantes quanto o suporte onde serão apoiadas. 

O mobiliário que utilizamos, na maioria das vezes, não é adequado ás longas horas de trabalho em nossas sofisticadas maquinas. Especialmente porque nos contentamos com qualquer mesa ou qualquer cadeira, o que se constitui em um erro mortal! Já constatamos casos de estudantes de design com casos flagrantes de LER durante o seu curso, o que é um fato preocupante para as futuras gerações de profissionais que estão chegando a mercado. A LER, a Lesão por Efeito Repetitivo é uma doença degenerativa, sem cura e um típico subproduto do uso desenfreado da informática. Ele provoca a aposentadoria precoce de indivíduos e os incapacita para as atividades da vida diária, quase sempre permanentemente e com muito sofrimento. Isso sem falar em problemas de coluna ou de circulação, por longas horas de postura sentada. 
Evitar o LER é mais uma das preocupações que devemos adotar para garantir que nossa carreira de designer seja longa e sem percalços. Portanto devemos cuidar de nossa estação de trabalho da mesma forma com que cuidamos do que estamos projetando. O bom senso e o conhecimento de ergonomia são características do Designer, não esqueçam! 

Há porém alguns detalhes, que devem ser observados em toda e qualquer estação de trabalho: bordas arredondadas nos tampos, utilizar apoio de pulso para teclado e mouse, ter tomadas à mão e com os requisitos de segurança, ter possibilidade de uma boa acústica, o que é cada vez mais raro, uma boa rede” wireless”, sem necessidade de cabeamento. 
Ter boas cadeiras giratórias, com todas as regulagens e com assento e encosto separados mas “sempre” com braços (também reguláveis!), ter uma iluminação individualizada e regulável, ter alguma privacidade, o que nos novos ambientes é cada vez mais difícil, especialmente nas novas mesas plataforma, são alguns pontos a serem observados.

Antes de tudo, deve-se privilegiar a flexibilidade e a mobilidade do nosso mobiliário. Devemos procurar especificar, para nós mesmos, um mobiliário que assegure ao exercício da atividade do design longevidade e não usar apenas o critério do preço!

Design sem LER é poder! E por mais tempo!

Texto não publicado.

Design e a miopia estratégica

O pais vive nesta virada do ano uma época de euforia, a economia estabilizada, a oferta de empregos, as exportações, as descobertas de petróleo, o IDH, as vendas de natal, estão fazendo todos enxergarem um futuro cor de rosa.

Simultaneamente continua havendo uma visão truncada quanto a nosso desenvolvimento industrial, especificamente no que se refere ao design. Quando foi criado o Programa de Qualidade e Produtividade esqueceram de incluir o design, o que não aconteceu em qualquer outro pais do mundo. Mais tarde criaram o Programa Brasileiro do Design para concertar o erro, uma iniciativa claudicante de governos passados e que mesmo no governo atual nunca conseguiu dizer a que veio. Mais recentemente na divulgação do PAC da Inovação novamente esqueceram do assunto já que no seu texto não há uma palavra sobre design. Falou-se de patentes, de inovação mas o design foi solenemente ignorado, como se ele não fosse parte da tecnologia e da inovação.

O descaso com o design por parte das federações de indústria e do comércio e de nossa classe política beira o absurdo, e nas raras ocasiões onde se manifestam sobre o assunto parecem estar fazendo favor ao design e aos designers. Nossa classe dirigente ignora solenemente o potencial de valor agregado que o design pode trazer para nossa produção, em todos os níveis.

Por outro lado o Design Excellence, uma iniciativa da Apex, que organiza nossa participação no If da Feira de Hannover continua premiando o design brasileiro no exterior, além de outros 30 concursos regulares de design, dão visibilidade de inegável qualidade ao design nacional. Apenas as indústrias multinacionais e algumas empresas nacionais mais iluminadas tem se beneficiado da qualidade do design nacional, o que também atesta nossa capacidade na área. Apesar disso não encaramos o design como um fator estratégico do desenvolvimento industrial, como o fazem Coréia, a China, e o Japão mais recentemente e a Alemanha, Itália, o Reino Unido e os paises escandinavos na metade do século passado.

Até quando o governo vai ignorar o design como estratégia? Até quando o pais vai teimar sistematicamente em não utilizar deste instrumento de desenvolvimento? Até quando vamos dispensar o fator de geração de valor agregado mais barato e eficiente que existe? Até quando vamos deixar de nos beneficiar de utilizar o design como fator de melhoraria de nossa produção e de nossa qualidade de vida?

A maioria do empresariado de capital nacional precisa corrigir sua miopia crônica em relação ao design. Necessitamos com urgência de uma verdadeira cirurgia para eliminar a miopia estratégica a respeito do design em nossa classe dirigente e em nosso meio produtivo. Não há óculos que dê mais jeito!!

Texto publicado no Site http://www.abedesign.com.br/
05.2008



O legado de José Carlos Bornancini (1923-2008)

Quem não tem ou teve um produto desenhado por Bornancini em casa? Uma tesoura Ponto Vermelho, uma faca Corte Laser, uma garrafa térmica Termolar ou quem sabe foi alimentado pelos pais com o Talher Criança.? Quem valida seu Cartão nos ônibus do Rio de Janeiro e de outras cidades, não deve saber que diariamente entra em contato, até por mais de uma vez, com um produto desenhado por este pioneiro do design brasileiro.

Este engenheiro por formação, professor e designer por opção conseguiu nos demonstrar que o design brasileiro tem qualidades, respeitadas inclusive no exterior, muito antes de termos profissionais aqui formados e antes ainda da atual fase de reconhecimento pela qual, afinal, estamos passando. Sozinho, com seu sócio ou liderando equipes, desde os anos 50, conseguiu superar as resistências atávicas do industrial de capital nacional (e multinacional) a melhorar seu produto com um projeto coerente, racional, ergonômico e também belo quando era necessário, isso sempre sem cópia. Ao contrario demonstrou que o nosso produto por ser bom, pode ser copiado, já que teve inúmeros casos de contra-facção de seus projetos inclusive na Alemanha, berço histórico do bom design.

Bornancini e Nelson Petzhold estiveram na ESDI em maio de 2003 e proferiram a aula inaugural onde falaram de seu trabalho, enfatizando o uso da percepção visual, o foco na inovação e na coragem de inovar, como forma de contribuir para um mundo melhor.

Bornancini nos deixou, no dia 24 de janeiro. Com ele se foram muitas boas idéias, muitos ensinamentos, a companhia sempre agradável de uma verdadeira unanimidade, e algumas das mais divertidas tiradas sobre nós mesmos e nossa sociedade.
Bornancini nos deixou a crença que, se tudo que ele realizou em sua época foi possível, será possível levarmos o design brasileiro no futuro ao respeito que ele merece, mas sem nunca perder o humor!

Foi uma honra e um privilegio enorme termos convivido com Jose Carlos Bornancini.

Texto publicado no newsletter "Sinal" http://www.esdi.uerj.br/sinal - Janeiro 2008

Um Design Onírico?


Em uma segunda feira de sol radiante eu me preparava para subir no avião com destino a São Paulo e me perguntava porque estávamos ali na pista, quando todos os “fingers” do Santos Dumont, recém reformado, estavam ociosos. Perdoei o fato pelo sol de outono que tínhamos a nosso dispor, sabendo o tempo que iria encontrar na capital paulista. Me ajeitei na poltrona do corredor que sempre utilizo quando um senhor, elegante e bem vestido, me pede licença para sentar na poltrona da janela destinada a ele.

O avião levanta vôo e admiramos a paisagem esplendida do Rio em sobrevôo matinal, que sempre deixa qualquer um de boca aberta. O senhor me da um sorriso e faz um comentário sobre o design da cidade, o que me apresso a concordar pois este é meu terreno. O design e o Rio. Faço alguns comentários sobre a qualidade do nosso design, ele me pergunta o que faço e relato brevemente minha atuação de meio designer e meio professor. Ele me diz que a sua empresa se utiliza muito do design e se apresenta como Manuel, de sobrenome indecifrável, presidente da GM do Brasil.

Admirado me animo com a conversa, já que conheço o departamento de design da empresa, onde por coincidência, trabalha um ex-aluno nosso e com os quais tivemos vários contatos. Até desenvolvemos no passado projetos em conjunto com nossos alunos, com suporte da empresa , como um interessante projeto de interior de automóvel destinado ao publico feminino. Somos interrompidos pelo serviço do micro lanche do serviço de bordo e comento que já tivemos dias melhores na Ponte Aérea. Ele ri e menciona que sabíamos administrar e contornar melhor a escassez típica de um país em desenvolvimento.

A conversa continua animada e pergunto por projetos atuais, nestes tempos de crise, de escassez de recursos, de excesso de cautela, de paralização de idéias. Ele me responde que estamos numa época de expectativas, enrola um pouco o papo e percebo que não pode revelar idéias corporativas. Para enfatizar meus argumentos, e dar uma de cara informado, relembro a ele que o departamento de design da empresa dele já teve atuação destacada em projetos de sucesso, como o Celta e o Prisma, por exemplo, que são projetos inteiramente nacionais e que até geraram um novo modelo de produção. Relembro a frente do projeto Sabiá, uma “pickup” conceitual apresentada em salões do automóvel internacionais e que foi aplicada em toda a linha Opel, da época. Falo das sucessivas remodelações da linha Corsa e Astra bem como de outros projetos pontuais que sustentam a imagem da empresa no Brasil e no exterior além do excelente estúdio de realidade virtual que possui atualmente.

Animado, faço ainda algumas considerações sobre designers brasileiros de empresas concorrentes, como a Volkswagen e da Fiat que atuam com sucesso no exterior e de novos players no mercado brasileiro, como os franceses que recentemente estabeleceram centros de design no Brasil. Ele se mostra impressionado com o meu entendimento do assunto e concorda com a nossa eficiência em termos de design automobilístico. Eu, meio bobo com meu desempenho, começo a extrapolar e coloco em questão o fato de não entender porque não temos uma montadora de capital verdadeiramente nacional, onde o design brasileiro fosse reconhecido, plenamente. Ele então, não se contendo, se aproxima de mim, por sobre a poltrona do meio vazia, e me confidencia em voz baixa que talvez estivéssemos próximos disso naquele exato momento. Dá a entender que a filial nacional da GM esta para ser vendida a um forte grupo nacional, neste processo de concordata que a GM americana está vivendo. Sem ser muito explicito dá a entender que está indo negociar o fato naquele dia. Eu o encaro meio atônito por ter me revelado este segredo e fico cheio de esperança, imaginando que nosso design automobilístico finalmente poderá ter o reconhecimento que os japoneses, os coreanos ou mesmo os recém chegados indianos e chineses, tem, mesmo tendo começado muito depois de nós.

Nos aproximamos de São Paulo e o aviso dos cintos e dos aparelhos eletrônicos proibidos ecoa pelo avião. Trocamos cartões e finalmente vou decifrar aquele nome inaudível lá do começo. Quando fixo meus olhos míopes no cartão, percebo estar sem óculos e começo a ouvir um ruído estranho e persistente.

Me assusto muito pois parece um ruído de emergência e a repercussão de uma tragédia aérea recente ainda está presente na memória. Descubro ao mesmo tempo aliviado e decepcionado que é o meu celular me despertando para um novo dia de trabalho onde vou encarar mais uma turma de alunos, tendo que convencê-los que fazer design no Brasil vale a pena. Será um sonho? Coloco os óculos e me levanto, como faço todas as amanhãs.

Texto não publicado - Junho 2009