O fato de Geraldo de Barros ter tido uma carreira tão diversificada e profícua se deve a uma coerência e uma objetividade quase que radical de sua parte. Sua curiosidade nas diversas mídias, e em colocá-las em questão são, uma forma de explorar princípios de atuação e de realização, oriundos de uma lógica predeterminada. Seu conhecimento e exploração da “Gestalt”, seu interesse por suportes e técnicas, por modularidade e sistemas, bem como a necessidade de fazer mais com menos, marcam o interesse que temos, nos dias de hoje, por sua obra.
Observando mais de perto sua trajetória, percebemos que essa lógica era coerente, em todas as suas diferentes formas de expressão. O “jogo de dados” sempre presente, mesmo na obra mais precoce, como a fotografia. Seu interesse “digital” já se mostrava em seus primeiros fotogramas, dos anos 40, onde superpunha cartões perfurados em suas experiências fotográficas. Seu uso de tiras de papel, o foco em sombras cúbicas ou lineares, justaposição de imagens, já anunciavam seu interesse em explorar os elementos da Gestalt, sempre com algum ”sistema” por trás.
Voltando ao design, isso se vê nas primeiras cadeiras em metal para a UNILABOR, que se resumiam a dois cubos perfeitos superpostos, executada em tubos, ou nos módulos da estante modular para a empresa, tão publicada por ai. Nas suas primeiras pinturas concretas, os cubos em perspectiva cavaleira ou isométrica, estavam muito presentes e demonstravam seu fascínio por esta forma e pela ambigüidade na sua apresentação. Isso se confirmou quando conheceu a obra de Max Bill e dos concretistas, que vinha de encontro a sua experiência com foto e mobiliário.
Sua experiência industrial veio abrir novas possibilidades de uma combinatória, agora com a exploração de técnicas próprias do ramo. Os móveis em aglomerado recortado e pintado se tornaram uma marca registrada da Hobjeto, onde os cubos passam a ter cantos arredondados e mais adequados ao contato humano. A pintura industrial, o uso de laminados de formica, passou a ser utilizada também em sua obra artística.
Seus “Jogos de Dados” são uma série de quadros, onde os dados (formas cubicas isométricas) são combinados sistematicamente, com outros dados (cores), em preto, cinza e branco, ou em cores cuidadosamente escolhidas e com uma ambigüidade determinada. Sua execução é feita por especialistas, e somente poderia ser realizada assim. A qualidade desta execução, que se reflete inclusive nas costas dos quadros, resulta numa determinação por parte do autor de uma combinatória, somente possível com a apropriação desses meios de produção. Como um projeto de design, como um contraponto, originário de uma idéia, em que arte e design se combinam em uma entidade única. Uma perfeita conjunção do digital com o analógico, como sempre Geraldo desejou, mesmo sem ser tão comum, nos dias de hoje.
Geraldo de Barros – A arte como sistema!!!
Esse texto, ligeiramente modificado, foi publicado no Catálogo "Geraldo de Barros :Imaginário, Construção, Memória" Organização Itau Cultural, São Paulo, SP 2022.